Era um jardim encoberto
Há muito, não mais florado
Nem de longe, nem de perto
Por seu dono: ignorado
no brilho à sua moda
o coração apagado
na fábula que acomoda
em si mesmo afogado
em seus olhos a ternura
sua imagem desvanecida
mais ao fundo a negrura
de uma poesia esquecida
a dúvida me adoecia
a inquietude o incomodava
a proibição me aborrecia
a esperança o acordava
no silêncio, o desengano
fecundava no tempo silente
o jardim não era engano
cada palavra, uma semente
perdidos em torno de um ciclo
sussurramos na hodierna missiva
eu assisto, planto, e reciclo
e a semente, sofre imersiva
tateou-me inconfessa,
embora um pouco tacanha
em duvidosa promessa
de xingarmos na montanha
na saída lenitiva
da vontade abrasiva
no consolo da alienação
em riso, nossa dimensão
e neste jardim secreto
— com decreto —
desprezado por seu proprietário
— um quase otário —
tornei-me um jardineiro
— com roteiro —
e semeei em seu solo
— um quase dolo —
como areia escoamos na ampulheta
em nossos longos dias de verão
sua imagem viva na vinheta
era apenas o ciclo de uma estação
Eis uma das verdades mais severas:
do que foi secreto por seis primaveras
O jardim não era invisível
Nem seu solo inacessível
Era seu dono quem não queria ver
E assim, com tristeza, o esconder
o inverno do medo viria
do abandono eu já sabia
mas ainda que o gelo cresça
logo, torço, que floresça
ao seu dono:
mais dano!
Por sua tristeza:
mais beleza!
às suas flores:
mais amores!
Não mais inverne:
mas governe!
diamante intocado
verdadeiro deserto
mundo inabitado
agora, desaberto
regado e colorido
para sempre florido