segunda-feira, maio 25, 2015

Ser "fidelidade" sob o preço da deslealdade. Ou: Por isso meu ministério não é fidelidade, não esta daí, ao menos.

Soube que um líder de uma grande Mocidade, saiu no auge de sua liderança direto para fundar um Ministério, e levou com sigo a terça parte desta mocidade. Lembrou de Apocalipse 12? Pois é...

O grande pai da Reforma Protestante Martinho Lutero nunca saiu da Igreja Católica Apostólica Romana (ICAR) para fundar o Movimento Protestante. Não mesmo. Ele foi expulso, excomungado via bula papal "Exsurge Domine", para só então oficializar uma nova era do Cristianismo. Os cristãos, agora livres do Papa, podiam finalmente respirar novos ares religiosos longes de todo paganismo, tradicionalismo, sincretismo, marianismo, e outras coisas que Lutero acreditava e defendia. Lutero, odiado pelo clero católico e amado pelos protestantes, podia finalmente dizer: “... tentei reformar a Igreja, mas ela não me permitiu então a mudei com aqueles que me permitiram...”.
Porque existe o cristianismo? Porque Cristo dividiu? Não! Foram os judeus que não aceitando Cristo e as suas palavras expulsaram os judeus convertidos e chamavam-no de adeptos da “seita do Nazareno”, ou ainda de “cristãos”. Mas estes cristãos tentaram e o próprio Cristo tentou mudar o judaísmo, mas “não conseguiu”, então “fundou” a Igreja com aqueles que “O receberam”. Depois do terceiro século da Igreja, com a “romanização” da igreja, a unidade dela permaneceu até a “cisão” do Oriente e depois com a “Reforma Protestante”, em 1.517 D.C. Os protestantes reformados viram em 1906 um fenômeno denominado “pentecostalismo”, e rechaçaram-no como heresia. Os pentecostais por sua vez uniram-se com os seus pares e “fundaram” o movimento pentecostal. Um exemplo desta história é a dos suecos Daniel Bergh e Gunnar Vingren que após terem sidos expulsos da Igreja Batista por afirmarem o pentecostalismo uniram-se aos batizados com o Espírito Santo e fundaram o que hoje é a maior igreja pentecostal do Brasil, a Assembleia de Deus. Temos vários outros exemplos de líderes  liberais sendo expulsos de igrejas conservadoras, e líderes conservadores sendo expulsos de igrejas liberais, líderes unicistas sendo expulsos de igrejas triteístas ou trinitárias, enfim, sabem-se estes líderes tentaram publicamente e explicitamente mostrar o que discordavam e no que discordavam, e foram expulsos...

Esta história toda é uma pequena e bem resumida história para reiterar a minha abjeção para com estas igrejas que têm se aberto sobre a bandeira de uma nova visão, sem antes terem “batidos de frente” com o sistema de onde vieram.

De que vale o ministério Fidelidade, se não houve antes do ministério a Lealdade?

Há sim muita diferença entre os dois princípios, a fidelidade é sem dúvida a mãe de todas as virtudes, sobre ela já escrevia o poeta e escritor italiano Edoardo Sanguineti:
“a fidelidade não é um valor entre outros: ela é aquilo por que, para que há valores e virtudes. Que seria a justiça sem a fidelidade dos justos? A paz, sem a fidelidade dos pacíficos? A liberdade, sem a fidelidade dos espíritos livres? E que valeria a própria verdade sem a fidelidade dos verídicos? Ela não seria menos verdadeira, decerto, mas seria uma verdade sem valor, da qual nenhuma virtude poderia nascer. Não há sanidade sem esque­cimento, talvez; mas não há virtude sem fidelidade...”.

Ao escolhermos o nome de uma instituição, seja ela religiosa ou não, procuramos resumir em poucas palavras a maior virtude nossa, e que emprestamos àquela. O Ministério Fidelidade sem dúvidas descreve a maior virtude viciada de seu fundador: a Fidelidade, e sobre ela já escrevia Andre Comte Sponville:
 “[...] a fidelidade é ou não louvável? Conforme, ou seja, depende dos valores a que se é fiel. Fiel a que? [...] Ninguém dirá que o ressentimento é uma virtude, embora ele permaneça fiel a seu ódio ou a suas cóleras; a boa memória da afronta é uma má fidelidade. Tratando-se de fidelidade, o epíteto não é tudo? E há ainda a fidelidade às pequenas coisas, que é mesquinha e tenaz memória das bagatelas, repisamento e teima [...] A virtude que queremos não é, pois, toda fidelidade, mas apenas a boa fidelidade e a grande fidelidade...”.
De qual fidelidade estamos falando, quando falamos do Ministério Fidelidade? Ao atentarmos ao passado não muito distante de seu fundador principal, evidentemente estaremos diante da fidelidade vesga e tosca, quando não cega. Estamos diante de um senhor que quando era líder, rendia pompas e elogios ao sistema da qual agora se desfez, sem nem ao menos ter tentado muda-lo por dentro, por meio de sua influência e de todos os outros meios que lhe fora conferido.

- “Ah! Mas isso seria rebelião!”. Poderia pensar o cristão desatento à História.

Não... Lutero e todos os demais não fizeram uso de máscaras diante de seus superiores e/ou diante de sua igreja. Não se prestavam ao ridículo das lisonjas e bajulações amanteigadas quando não concordavam com aquilo que viam. Os pastores fundadores de suas igrejas não eram lacaios de suas sedes, e nem tão pouco fantoches sob o altar. O que eu vi e ouvi no aniversário “jubiloso” da mocidade de sua denominação anterior foi o ventriloquismo de quem achava que tudo estava bem, maravilhoso e colorido, as gravações em DVD feitas na época não me deixam só em meu testemunho, foi uma chuva de rendições elogiosas a tudo, e a todos. Sabem o que é isso? É a fidelidade ao “status quo”, a fidelidade ao “sistema”.
Onde está o erro em ser fiel ao que discorda? O erro está na inexistência da fidelidade do que é forçado, isto é,  daquilo que não é espontâneo, do que não é sincero. Não há fidelidade, quando não se é fiel ao sentimento, como bem observou o filósofo brasileiro Edson Marques ao dizer que a fidelidade tem que ser espontânea, pois se for preciso esforçar-se para suportar a fidelidade, ela deixa de ser fidelidade e se transforma em mortificação...
Não obstante, além do erro do termo “fidelidade” estar fora de seu conceito filosófico, também está no seu conceito etimológico, pois a fidelidade como vocábulo oriundo do latim “fides” indica “adesão”, “aderência” ou ainda “colagem” de um principio de religião. Isto quer dizer que quem é fiel, o é por adesão, como algo colado em si, e que não pode ser ignorado quando se está em outra denominação, apenas porque esta não aceita a sua “visão”. Em outras palavras, quem é fiel não fica “de quatro” durante vários anos somente para agradar a chefia, pois isso já é na prática uma fidelidade aos seus superiores e infidelidade aos seus princípios. Além de ser desonestidade pública é também uma forma de deslealdade.
O Princípio da Lealdade é a franqueza nos tratados interpessoais, de modo que é uma atitude desleal guardar para si e esconder da igreja, ou de seus superiores um segredo, um desejo, uma “carta na manga”, uma ideologia, ou mesmo uma opinião. A lealdade impõe ao líder o dever da verdade. Para o bem da deontologia da liderança da Igreja, um líder não pode sacar como um “trunfo” o seu desligamento da igreja para o fundamento de sua própria igreja. Na filosofia contemporânea é a “Stanford Encyclopedia of Philosophy” em seu artigo “Virtue Ethics” afirma  que a deontologia é  uma das conjecturas normativas, e que as escolhas são moralmente necessárias, proibidas ou permitidas e que, por conseguinte inclui-se entre as teorias morais que orientam nossas escolhas sobre o que deve ser feito. Esta é sem dúvida o dever do líder: escolher o que deve ser feito, enquanto líder. É uma obrigação moral do líder, ainda que seus superiores o desliguem de sua função, ao menos ele tentou. Isto é lealdade à consciência do evangelho em primeiro lugar, depois a lealdade se estenderia aos seus deveres e as suas obrigações éticas, morais, políticas e religiosas. Desta forma a fidelidade viciada seria corrigida pela lealdade, e o vício (defeito) se tornaria uma virtude (qualidade), como bem disse a antropóloga Margaret Mead:
 “A virtude é quando se tem a dor seguida do prazer; o vício é quando se tem o prazer seguido da dor.”. 
O protestantismo é a virtude de se ter a dor pela escolha pública da verdade pelo prazer da consequência pública da verdade. Já o vício da escolha pública da omissão, só se escancara pelas consequências desastrosas da covardia do líder fiel ao sistema, e não ao sentimento.
Uma vez ouvi do pastor batista Ed René Kivitz, num programa de Natal do apresentador Danilo Gentili a seguinte expressão:
 “Na interpretação bíblica, os católicos fazem opção pela unidade, já os protestantes optam pela verdade.”.  
Esta é uma definição do que deveria ser o protestantismo, mas infelizmente não é.
Os protestantes de hoje estão cada vez mais frouxos e “de quatro” aos “coronéis de Deus”.  Eu sou contra que se abram igrejas, pois já temos muitas e para todos os gostos. Porém, há uma exceção, uma garantia conquistada pelos ideais protestantes, que é a abertura e fundação de um novo ministério, após o protestante ter tentando por todos os meios públicos mudar a igreja da qual era membro e ter sido excomungado por isso. Sem esta exceção eu sou contra que se abra outra igreja.
Tenho horror ao “protestantismo rosa” que se estabeleceu no acordo entre líderes cujo maior feito é exatamente a conivência e o adestramento. Na psicologia dos discípulos vemos Pedro, Tiago, João, Natanael, e os demais ora duvidando, ora expondo suas incertezas e insatisfações para com Cristo. Estes foram, depois, convencidos por seu Mestre para aderirem à fé n’Ele. Por outro lado vemos Judas Iscariotes, sempre religiosamente civilizado, um tesoureiro aparentemente impecável. Demonstrando apreço ao sistema ao dizer para Jesus que este deveria vender o Bálsamo e dar aos pobres. Um filantropo exímio. Mas acabou por trair seu mestre, com uma cartada na manga. Pois no seu ministério de fidelidade faltou a Judas a lealdade em dizer para Cristo a sua insatisfação pessoal.
Se Lutero não tivesse tentado mudar a Igreja, e simplesmente saído para fundar uma igreja, faltar-lhe-ia a lealdade, e isto é a marca da traição moral e ética para com a verdade — ainda que seus superiores não quisessem a verdade — Lutero não passaria de um traidor, de um oportunista, mas Lutero não permitiu que seu cargo fizesse dele um mero lacaio do sistema.
Não quero aqui com este artigo criticar nenhum membro, ou mesmo o seu fundador omisso enquanto era líder, esta é apenas a minha posição em defesa do verdadeiro significado dos valores e dos ideias protestantes, mas afinal, quem é que esta preocupado com isto não é mesmo?


 
Este é Lutero apresentando publicamente a sua insatisfação enquanto ainda era da Igreja Católica