A superação é, a princípio, uma impossibilidade filosófica. A Banda inglesa Pink Floyd chegou ao ápice de seu sucesso com o icônico álbum “The Dark Side of the Moon” de 1973. Após isso começaram a viver a aflição de sempre tentar superar o álbum anterior. Conseguiram com o sucesso de “Wish You Were Here (1975)”, “Animals (1977)” e o aclamado “The Wall (1979)”, superar a genialidade de cada fase musical. Mas a tensão entre os integrantes alcançou o seu ápice após este último álbum, levando a saída de seu principal compositor, Roger Waters[1]. Em 1987 David Gilmour[2] assume então as rédeas de Banda, após uma intensa briga judicial, e ainda um pouco perdido na liderança da Banda, lança o álbum “A Momentary Lapse of Reason (1987)”. Críticas das mais variadas arrasaram o recém líder. Mas em 1994 a banda decide lançar o álbum “The Division Bell”.
Neste álbum, após a faixa musical introdutória, começa a ser tocada uma melodia idêntica a outra melodia de Gilmour em álbum solo. Os fãs sem dúvida ao ouvirem pela primeira vez pegaram as pedras nas mãos para acusarem a Banda de autoplágio, quando de repente a música toma forma e começa a ser cantada pelo guitarrista Gilmour.[3]
Observem a letra a seguir:
What do you want
from me?[1]
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O que você quer de mim? [2]
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As you look around
this room tonight
Settle in your seat
and dim the lights
Do you want my
blood, do you want my tears
What do you want
What do you want
from me
Should I sing until
I can't sing any more
Play these strings
until my fingers are raw
You're so hard to
please
What do you want
from me
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Enquanto você olha esse quarto essa noite
Se arruma na cadeira e diminuem as luzes
Você quer meu sangue, quer minhas lágrimas?
O que você quer?
O que você quer de mim?
Devo cantar até não conseguir cantar mais?
Brincar com essas cordas até meus dedos apodrecerem?
Você é difícil de agradar
O que você quer de mim?
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Imaginem os fãs ouvindo a letra e jogando as pedras no chão. O então líder da Banda conseguiu superar o álbum anterior, hoje é tido como obra consagrada, mas na época desabafou aos fãs: o que vocês querem de mim? Devo superar o insuperável? Fazer o impossível? Tocar e cantar e só parar quando tiver conseguido algo melhor?
Esse é sem dúvida o maior desafio na superação: a autossuperação!
O desabafo do líder neófito pode ser só uma franqueza para consigo mesmo. O descortinar da alma pode revelar no imaginado outro apenas eu mesmo. A consciência do líder pró-ativo tende a ser um tribunal em contínuo aberto; onde este se confronta diariamente nela — na consciência— e se presta a ser julgado, e para ela responde como eterno réu: “eu posso mais do que isso?”. Não obstante, acumulado neste litígio a qualidade do perfeccionismo, é certo que a resposta será sempre positiva, ou seja, a resposta será sempre: “sim, eu posso mais!”[6].
O Perfeccionismo no sentido de autocobrança pode ser uma excelente qualidade, pois o líder exigente é sempre insatisfeito com o que faz e procurará sempre fazer além do comum.
Em outras palavras é um eterno vencedor de si mesmo, sempre batendo o próprio recorde.
Mas quando o perfeccionismo é patológico, há o risco de ele desenvolver uma “Personalidade anancástica”. Na psicologia há uma classificação particular, uma divisão interna, de transtornos específicos da personalidade, o perfeccionismo está atrelado aos distúrbios graves da constituição caracterológica e das tendências comportamentais do indivíduo, não diretamente imputáveis a uma doença, mas atingindo a personalidade.
Para a ciência que estuda o comportamento e as funções mentais, o perfeccionismo é:
“o transtorno da personalidade caracterizado por um sentimento de dúvida, escrupulosidade, verificações, e preocupação com pormenores, obstinação, prudência e rigidez excessivas. O transtorno pode se acompanhar de pensamentos ou de impulsos repetitivos e intrusivos não atingindo a gravidade de um transtorno obsessivo-compulsivo.” [7]
Como então racionalizar que existe um limite a se transpor, e sentir a felicidade da superação sabendo que sempre haverá um limite a se romper, um recorde a se bater?
Estas coisas exigem menos racionalismo e mais sentimentos. A estabilidade psicoemocional não pode ser ignorada, “uma mudança de sentimento é uma mudança de destino.”, afirma o professor Neville Goddard.
Deste modo, não há como relacionar este paradoxo apenas racionalmente sem recair no perfeccionismo como uma angústia da alma.
Considerar, portanto, que ao mesmo tempo a “insaciável satisfação” e a “auto exigência como método de liderança” não garantem a sensação de superação, é de se deparar com uma impossibilidade filosófica, ou se preferir, a ideia de perfeição é inalcançável, e o melhor que teríamos a fazer é admitir que o conceito de superação seja frágil de mais. Diante deste dilema aparentemente indissolúvel, o brilhante físico Amit[8] explica que, há uma tese que ajuda a quebrar uma série de “paradigmas insolúveis” e os “dualismos que a ciência materialista nos impôs”, ou seja, devemos mudar o paradigma de pensamento que o criou. Neste mesmo entendimento cumpre-nos realçar há um mal do século, existente no seio de nossa sociedade e este mal é “a ansiedade”.
O filósofo Olavo de Carvalho, em seu artigo “A Lição de um sonho”, explica que somente a inteligência e a reeducação podem tratar deste problema:
“[...]
Numa alma bem estruturada, as emoções refletem espontaneamente o senso das proporções e a realidade da situação. A afeição, a esperança, o temor, a ansiedade, o ódio são proporcionais aos seus objetos e, nesse sentido, funcionam quase como órgãos de percepção. Afiná-las para que cheguem a esse ponto é o objetivo de toda educação das emoções. Na sociedade histérica, porém, cada um só pode alcançar esse objetivo mediante um tremendo esforço de tomada de consciência e de auto-reeducação. O que deveria ser simplesmente o padrão da normalidade humana torna-se uma árdua conquista pessoal.
[...]
A reeducação das emoções é impossível sem passar primeiro pela reeducação da inteligência, de modo que esta assuma, pouco a pouco, o comando da alma inteira e se torne o centro da personalidade em vez de um penduricalho inútil a serviço da autojustificação histérica. Ser inteligente é, nesse sentido, como já lembrava Lionel Trilling, a primeira das obrigações morais. Sem inteligência, até as virtudes mais excelsas se tornam caricaturas de si mesmas. ”[9]
A insatisfação quando se instala na alma do líder como uma autofagia destruidora; e o perfeccionismo, como um fenômeno que cerceia a capacidade de reconhecer os pontos melhorados, torna estéril o campo criativo para novas possibilidades, e prendem o líder a um comportamento obsessivo, como um cãozinho correndo em círculos atrás da própria cauda. O Perfeccionista deve procurar ajuda de um médico especialista para que diagnostique qual o grau do transtorno e o melhor tratamento. Às vezes, a solução quando não pode ser localizada nas emoções, pode ser encontrada no intelecto. Este é o exercício do qual propõe o filósofo no trecho do artigo supradescrito. Para ele é impossível à reeducação das emoções sem passar primeiro pela reeducação da inteligência. A superação de si mesmo começa, portanto na inteligência. Renovada a própria inteligência, tratada as emoções, e oxigenado a autoexigência exacerbada, o líder poderá encarar então a superação não como uma impossibilidade, mas como algo possível, pois já vivenciou em si mesmo a superação antes mesmo de conseguir superar seus projetos pessoais, profissionais e acadêmicos. Isto significa que a mudança começa em nós, depois no outro. Começar a mudança em si, é uma das muitas definições da palavra: exemplo, e neste caso um exemplo de superação:
“Líderes lideram pelo exemplo, multiplicam conhecimentos, escolhem pessoas melhores que si e são reconhecidos pelo resultado do seu time.” [10]
A minha maior intenção: fazer a liderança decolar. Mas até agora, com base nos últimos textos, o leitor exigente pode ter considerado que os textos focaram mais na área pré-voo, do que no voo em si. A grande questão é que todo o piloto sabe que o voo começa no chão, e não nos ares.
O maior desafio de voar é simples: sair do chão; e o segundo é manter-se no ar. Para sair do chão é preciso vencer o seu peso. Falamos sobre isso quando refletimos neste tópico sobre o desafio de vencer-se a si mesmo. O peso é uma importância, pois é a força exercida por um corpo sobre qualquer superfície que se oponha à sua queda. O fracasso é simbolizado pela queda, deste modo o tamanho da força que te leva a opor-se à queda é do tamanho da sua autoridade. Autoridade vem do latim “auctus”, particípio passado de “augere”,[11] “aumentar, fazer crescer”. Quanto maior é a força que te eleva à resistência da queda, maior é sua ampliação, ou seja, maior será a sua autoridade. Não obstante, a grandeza desta estende-se por todas as partes do avião, o que simboliza os departamentos que você e sua equipe abrangerão direta e indiretamente; mais a quantidade de combustível que é o todo da energia que você está disposto a gastar neste engajamento; mais toda a carga que você locomoverá do nosso ponto de partida até o nosso destino, que coresponde aos tripulantes (sua equipe e seus clientes). [12]
Em resumo, embora o peso seja gerado por todo o avião, podemos afirmar, segundo a aerodinâmica e a teoria do voo, que toda a força ocorre num único ponto, chamado centro de gravidade. Este ponto é você. Durante um voo, o peso do avião muda constantemente à medida que o avião consome combustível, este é o ciclo de vida do cliente. Por isso a distribuição do peso e do centro de gravidade muda também, para que o voo não fracasse o piloto deve estar em alerta constante para ajustar os controles, e transferir o combustível entre os depósitos, para manter o avião equilibrado. É incrível como estes processos se assemelham com a liderança.
Para os líderes com pensamento de pombo, voar é, talvez, no máximo, conseguir alcançar o fio de um poste. Para os líderes que pensam como a águia, é sempre possível alcançar mais alto.
Após voar com as águias é impossível voar com os pombos.
“A mente que se abre a uma nova ideia jamais volta ao seu tamanho original." Albert Einstein.
[1] Waters, George Roger. é um músico, cantor e compositor inglês. É um dos fundadores da banda de rock progressivo/rock psicodélico Pink Floyd, na qual atuou como baixista e co-vocalista.
[2] Gilmour, David Jon é um guitarrista, saxofonista, compositor e cantor britânico, vocalista da banda inglesa Pink Floyd.
[3] Biography - Pink Floyd | The Official Site, disponível em <http://www.pinkfloyd.com/history/biography.php> acessado dia 20 de julho de 2016.
[4] "What Do You Want from Me". Música de Pink Floyd, do álbum The Division Bell. Lançamento 28 de Março, 1994 (UK).5 de Abril, 1994 (US). Gravação 1993. Gênero(s) Rock Progressivo. Duração 4:09. Gravadora(s). EMI. Composição David Gilmour, Rick Wright, Polly Samson .Produção David Gilmour e Bob Ezri
[5] Tradução livre
[6]F60-F69 Transtornos da personalidade e do comportamento do adulto. , disponível em <http://www.datasus.gov.br/cid10/V2008/WebHelp/f60_f69.htm>acessado em 3 de julho de 2016.
[7] IDEM
[8] Amit Goswami é um professor aposentado de Física Teórica da Universidade de Oregon e estudioso da Parapsicologia.
[9] CARVALHO, Olavo de. A lição de um sonho. Diário do Comércio, 30 de dezembro de 2013.
[10] [10] Princípios e Valores da Siscom, disponível em <http://www.siscom.com.br/default.asp?p=principios>, acessado em 3 de julho de 2016.
[11] Antônio Martinez de Rezende, Sandra Braga Bianchet - 2014 - Language Arts & Disciplines
[12] Notas de estudo Engenharia Aeronáutica Unificada. Aerodinâmica - Apostilas -, disponível em <http://aviacaomarte.com.br/wp-content/uploads/2015/04/13Aerodinamica.pdf.>, acessado dia 07/07/2016