quarta-feira, janeiro 25, 2017

A contradição da expectativa e da lógica






     I.        Expectativa Positiva: Esperança

A expectativa é parte da inteligência humana. Na enigmática conversa entre o Arquiteto e Neo, no filme Matrix[1], Neo se vê em uma bifurcação de escolha. A mente lhe manda optar pela porta à direita, o lado racional, para salvar a humanidade. Mas seu coração fala mais forte, e, para salvar a sua mulher amada, ele anda em direção à porta a sua esquerda, pelo que o calculista Arquiteto analisa a sua escolha e lhe diz:
“— Esperança. Eis a quintessência do delírio humano, ao mesmo tempo fonte de sua maior força e de sua maior fraqueza."
Para o Arquiteto, programa elaborado por máquinas artificialmente inteligentes para a Construção de um mundo que prendesse a mente humana numa realidade vivenciável, a expectativa positiva, esperança, é a quintessência da fé humana, uma certeza das coisas que se espera, mesmo não se vendo[2]. Quintessência é uma alusão para com a filosofia de Aristóteles que considera o universo como um composto de quatro elementos principais - terra, água, ar e fogo-, e um quinto elemento. Para ele é uma substância etérea que permeia a tudo e impede que os corpos celestes venham a cair sobre a Terra.[3] A esperança é, portanto o sustento do homem sobre a racionalidade. Assim como para Aristóteles, na Cosmologia, assim é para o pensamento do Arquiteto: a esperança evita o colapso do Mundo. Sem ela o homem se desespera, se vê sem rumo, entra em depressão, não vê saída. Na Mitologia Grega, no evento conhecido como “A Caixa de Pandora”, Pandora abre a Caixa, deixando escapar todos os males do mundo, menos a esperança. Sobre ela o filósofo Friedrich Nietzsche sentenciou “A esperança é o pior dos males, pois prolonga o tormento do homem”. Dalai Lama tenta conciliar o que se parece um paradoxo; para ele devemos manter a esperança, mas prepararmo-nos para o pior. Já para a teologia judaico-cristã a esperança é sempre incentivada, seja no além, ou no aquém. Sobre todo o prisma que se olhe pelo caleidoscópio da filosofia, o tema esperança é uma expectativa constante na mente do homem. O que é, pois a economia se não a expectativa dos agentes econômicos? Tudo àquilo que não é exato cinge o conhecimento puramente humano, e dele é totalmente dependente.

   II.        Expectativa Negativa: Pessimismo VS. Inveja

No entanto superar expectativas é muito mais do que superar somente as expectativas positivas, há sempre àqueles que esperam o pior de nós. Ainda mais depois de termos passado por um erro recente. Como, pois, superar todas as expectativas possíveis?
Superar é também aprender que existe uma multidão em seu desfavor. E sempre haverá pessoas na expectativa de seus erros. Não podemos confundi-las com os “pessimistas”, pois sob o olhar do pessimista, o instante que não compreendemos é o eterno desmoronamento do imponderável que foge de nosso alcance. É uma inexorável conspiração do Universo sobre os mortais. É o “agora perpétuo” que trama sempre na contramão da escolha, e, de certa forma, é mais fácil viver dentro de uma noção filosófica de que a vida se baseia no fatalismo. Assim espera-se sempre o pior, de modo que não precisaríamos responder as consequências de nossos atos, pois estes foram, são e serão sempre fatalidades incoercíveis. O pessimista, portanto adota não a expectativa de erros, mas aceita-na como verdade absoluta que rege tudo aquilo que ele não se compreende, e daquilo que não se consegue explicar.
Os que almejam o erro alheio são àqueles que preferem justificar suas falhas e fracassos no erro do outro. De certa forma, há um silencioso regozijo em pensar: — “viram só, eu já sabia que ele também não iria longe”. Espreitam a derrota de quem, na verdade, admiram. Ele ambiciona o que o outro poderia desfrutar. Sua esperança é proporcional à admiração. Caso assista o erro, acredita que não existe mais ninguém acima de si.
É o verdadeiro reconforto do fracassado.
Estas pessoas que nos cercam diariamente, geralmente, são ativas, e vestem-se de conselheiras, fantasiam-se de amigas, tentam te desanimar apresentando uma única e (pseudo) reconfortante saída: a desistência!
O discernimento para o líder  não é uma mera ferramenta, mas é a sua lente de “visão de raio-X” para verdadeiramente ler através de pessoas. O líder sem discernimento é cego, e sua liderança não pode alcançar sua equipe. 


O líder sem discernimento pode até ser inteligente, mas não sábio, pois não há sabedoria sem a prudência; e é impossível saber com o quê se deve ser prudente se o líder não souber discernir:



   I. o que está em jogo;

   II. quem são as peças; e
   III. quem são os jogadores.


Não há dúvidas: em qualquer jogo, o líder sem discernimento é sempre a peça!

Mas o discernimento cobra o seu preço: a frieza. Superar-se é vencer olhares que demonstram dor diante do brilho que se mostra no valor da resistência.
O filósofo francês, René Girard, tem uma tese sob este sintoma da alma humana: “desejo mimético”, resumida como “deseja-se aquilo que o outro deseja”.[4] Mimético, porque vem de mímesis, ou seja, o desejo revelado ou inconsciente leva à violência. 
“Ele é a angústia do mundo que o reflete. Ele é o que se recusa às verdadeiras fontes da emoção, as que são o patrimônio de todos, e, encerrado em seu duro privilégio, semeia pedras…” [Vinicius de Moraes][5]
           A maior dificuldade de um líder nestas horas, talvez seja manter o foco em sua recuperação e não se inebriar no ódio do outro. Por mais pessoal que estas linhas possam parecer, a humanidade de um líder é inata, e ignora-la é um grande erro. Ninguém é superior ao que se é em essência.
Por oportuno, noto que geralmente para as pessoas cujo “reconhecimento” é a primazia de todo o trabalho, esta superação torna-se quase impossível. Como, pois ignorar o desprezo, a indiferença, e a retaliação pelo trabalho duramente desenvolvido? Na superação, não espere que ninguém reconheça seus esforços. Diferentemente do sucesso, poucos serão os que rirão com você; e diferentemente do fracasso, poucos serão aqueles que chorarão com você. Sua recuperação apresenta uma ameaça. Não se surpreenda com “colegas de trabalho” querendo suplantar seus sonhos. Há um jogo de interesses, e você está no caminho deles. Encare isso como parte do processo. Mantenha o foco. Vença!

                   IV.        Expectativa simples: Perspectiva e Probabilidade

          Existe dentro da economia uma metodologia, chamada de “expectativas adaptativas”. Estas não são de natureza negativa como àquelas supramencionadas. A expectativa adaptativa é formada basicamente por pessoas que desenvolvem suas perspectivas sobre acontecimentos futuros com base em acontecimentos passados. Na filosofia política, estas pessoas são conservadoras ou reacionárias. Elas reagem a qualquer tipo de revolução que desconsiderem eventos passados. Na teologia cristã há divergência entre os grandes teólogos considerados pais da Igreja para com a Teologia Judaica. O Bispo de Hipona e Santo Agostinho em seus longos tratados debruçaram sobre o tempo como tema e fonte da vida humana. Para o bispo de Hipona o tempo é separado em duas dimensões: o eterno e o histórico. Para ele o tempo se confunde em presente passado e futuro: em um só instante. Santo Agostinho, grande filósofo que seguiu a linha de Platão em sua forma de pensar, ousou dizer em sua teologia, que a simultaneidade do tempo está para além do passado, presente e futuro. Pois para ele toda História era precedida pela realidade e prevista pelo Ser Eterno.  Já o rabino britânico, Jonathan Sacks, evidencia que os Oráculos da história hebraica não equivaliam à tragédia aos acontecimentos ruins em seus prenúncios, mas a todo o tempo diagnosticavam o mal de Israel em suas escolhas e davam a solução: “arrependimento”. Por mais estranha que esta palavra possa soar nos recintos profissionais, o termo só significa uma coisa: “mudança de postura”. Portanto, de certa forma a literatura semita possibilita ao alcance do ser humano a alteração do futuro a qualquer momento. E neste sentido a cultura cristã está mais próxima da teologia grega, do que da judaica. É aquilo que chamamos de livre-arbítrio contra o destino.
           Desta sorte a expectativa donde tudo se baseia no fluxo e refluxo do sempre corrente tempo, o melhor método para se tomar decisões é empírica, baseia-se na experiência, na indução e na intuição. Assim se baseia a “expectativa adaptativa”, pois neste sentido, por exemplo, se a inflação no passado esteve mais alta do que o aguardado, as expectativas para o futuro serão reconsideradas. [6] [7] [8]. Esta expectativa adentra mais o campo da racionalidade. São questões que devem ser levadas em conta no processo de reconstrução e do planejamento.


Superando a Lógica


                    V.        Ilógica: a lógica não estreada


Savielly Tartakover, grande xadrezista russo, definiu bem a diferença entre usar o que se tem, em nosso favor, e a isso ele chama de tática. Para ele a “tática é saber o que fazer quando existe algo a ser feito. Estratégia é saber o que fazer quando não há nada a fazer.”, de certa forma estratégia é o objetivo ainda não alcançado. O filósofo, general e estrategista chinês, Sun Tzu cravou: “A estratégia sem tática é o caminho mais lento para a vitória. Tática sem estratégia é o ruído antes da derrota.”. A tática é resultado em curto prazo para se alcançar o objetivo fim. Não há recuperação sem expectativas próprias. Estratégia é tudo, e táticas são necessárias.
A superação quando extrapola não só a expectativa seja ela otimista, pessimista, ou possível, mas extrapola a lógica, é considerada uma suplantação àquilo que até então entendíamos como possível. Trataremos deste tema com mais abrangência nos próximos subtópticos, mas ainda neste ponto queremos trazer uma constante da superação: a contradição. Etimologicamente, a palavra de raiz latina vem de “contra” “dicção”. Assim, neste seguimento a contradição sugere algo como “falar contra alguma coisa”. É uma espécie de contrassenso. Isto porque o processo cognitivo, segunda a psicologia, trabalha com memória, aprendizagem, imaginação, pensamento, inteligência e atenção[9]. A memória está naquilo que é observável. O que não se pode observar é mera teoria. Daí ser uma constante contradição deveria ser o objetivo de todo o líder. Lutar quando tudo nos leva a desanimar é contradizer a lógica. Podemos ser ponte sobre águas, quando outros na mesma situação só seriam pedras no caminho.
Paul Graham excelente ensaísta, criou uma “pirâmide hierárquica da discordância”.  Nela classifica-se de baixo para cima formas como as pessoas acham que contradizem a pessoa com a qual discordam, sendo o topo da pirâmide, a verdadeira forma de sobrepujar a lógica do outro, ou de si mesmo e a base é a forma errada e mais comum de responder um pensamento ou ideia do qual simplesmente discorda.
Pirâmide da Discordância, segundo hierarquia de Paul Graham [10]


Neste sentido, a superação do líder, da empresa, do ser como humano é uma refutação fática e incontraditável de que se inaugurou uma nova era de possibilidades para todos os outros que se encontram nesta mesma situação. Em outras palavras àquele que superar o, até então, insuperável será o novo padrão a ser seguido. Isso é inovação.
Supere. 
Seja um contrassenso vivo e ambulante.
Seja um exemplo maior do que as suas palavras!

[1] Matrix Reloaded - Filme 2003
[2] Alexandria, Apolo de. Carta aos Hebreus. Bíblia Sagrada. Capítulo 11, versículo 11.
[3] Quinta Essência, aula de cosmologia. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Disponível em <http://www.if.ufrgs.br/fis02001/aulas/quintessencia.html>, acessado 3 de julho de 2016.
[4] O desejo mimético, Um blog sobre René Girard e a teoria mimética, disponível em <http://renegirard.com.br/blog/?p=118>, acessado 3 de julho de 2016.
[5] MORARES, Vinícius de. Da Solidão. PARA VIVER UM GRANDE AMOR. disponível em <http://www.viniciusdemoraes.com.br/pt-br/prosa/da-solidao>, acessado 3 de julho de 2016.
[6] Como prever as taxas de juros do futuro, Clube dos Poupadores. Disponível em <www.clubedospoupadores.com/investimentos/prever-taxas-juros-futuro.html>, acessado 3 de julho de 2016.
[7] Sousha, Samer. Estrutura a Termo da Taxa de Juros e Dinâmica Macroeconômica no Brasil, disponível em <http://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/export/sites/default/bndes_pt/Galerias/Arquivos/conhecimento/revista/rev3011.pdf>, acessado 3 de julho de 2016.
[8]The Adaptive Expectations Model, disponível em < http://www.digitaleconomist.org/aex_4020.html>, acessado 3 de julho de 2016.
[9] Nascimento, R. O. (2009). Processos cognitivos como elementos fundamentais para uma educação crítica: Ciências & Cognição. Vol 14 (1). ISSN 1806-5821. Brasil: Minas Gerais. Disponível em: Acessado em 3 de julho de 2016
[10] In Contradiction Front Cover Graham Priest Clarendon Press, Feb 16, 2006 - Philosophy - 352 pages




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